Depoimentos de Cliente na Advocacia

Antes de decidirmos se é permitido, ou não, usar depoimentos de clientes, é crucial entender o papel que eles desempenham no marketing.

No marketing, depoimentos são conhecidos como prova social, um artifício de convencimento que utiliza a experiência de clientes satisfeitos para mostrar que seus serviços jurídicos são confiáveis e eficientes. Isso pode ajudar a criar uma percepção positiva sobre você e atrair mais clientes.

Mas... Existe uma Limitação

No marketing jurídico, nós, advogados, temos um Código de Ética, que impõe restrições ao uso da publicidade. Isso está previsto no artigo 42, inciso IV, onde determina que o advogado deve se abster de:

"Divulgar ou deixar que seja divulgada a lista de clientes e demandas."

Utilizando a hermenêutica nessa abordagem, chegamos a duas interpretações distintas:

  1. Literalmente, o artigo não proíbe explicitamente o uso de depoimentos de clientes, apenas a divulgação de uma lista de clientes. Assim, literalmente, seria possível usar apenas o depoimento, sem revelar o nome completo ou detalhes pessoais do cliente.
  2. Contudo, sob uma análise teleológica, considerando a finalidade da norma, o uso de depoimentos não seria recomendado, pois pode sugerir que os clientes foram atraídos por esses testemunhos, o que poderia ser interpretado como uma forma de captação irregular de clientes, algo que o Código de Ética busca prevenir.

Vamos pensar...

A essência do nosso Código de Ética é a proibição expressa da captação de clientes. Esta proibição abrange qualquer ato de venda ativa com o objetivo de persuadir os clientes a iniciar demandas jurídicas, instigando-os de forma direta.

Assim, o uso de depoimentos de clientes em estratégias de marketing deve ser tratado com cautela, pois pode ser interpretado como uma forma de captação irregular de clientela.

Essa perspectiva se baseia na análise de várias decisões do Tribunal de Ética e Disciplina (TED), que geralmente orienta a não deixar que a lista de clientes seja divulgada, e a uma tendência à interpretação teleológica do artigo 42, inciso V.

Vejamos o processo do TED/SP de n. 4979-1/2024

PUBLICIDADE PROFISSIONAL – MARKETING JURÍDICO – PUBLICAÇÃO DE DEPOIMENTOS DE CLIENTES EM PÁGINAS DE ESCRITÓRIOS DE ADVOCACIA – VEDAÇÃO ÉTICA. A publicidade na advocacia é sóbria, discreta e informativa. É a divulgação que, sem ostentação, torna público o perfil profissional e as informações verdadeiras atinentes ao exercício profissional, sem incitar diretamente ao litígio judicial, administrativo ou à contratação de serviços, sendo vedada a promoção pessoal. Publicidade é diferente de propaganda.  A prestação de serviços do advogado não é uma mercadoria e não pode ser tratada como tal. O serviço que foi considerado bom por determinado cliente pode não ser bom para outro. A advocacia é atividade meio e não de resultado. A publicação de depoimentos de clientes pode induzir o potencial cliente a entender erroneamente que tal profissional ou banca de advogados, em razão de tais publicações, teria mais qualificação e alcançaria resultados melhores que outros profissionais do mesmo ramo do Direito, talvez mais preparados. Como a avaliação da prestação de serviços tem caráter extremamente subjetivo, é difícil checar a veracidade das informações contidas nos depoimentos, inclusive porque os nomes dos clientes e dados dos casos não podem ser divulgados em hipótese alguma, para que não haja violação do sigilo profissional, que é de ordem pública e inderrogável. Precedentes. Proc. 25.0886.2024.014979-1 - v.u., em 16/05/2024, parecer e ementa da Rel. Dra. MARIA CAROLINA NUNES VALLEJO, Rev. Dra. RENATA MANGUEIRA DE SOUZA, Presidente Dr. JAIRO HABER. 
RELATÓRIO:

Caso opte por incluir depoimentos em sua estratégia de marketing, o que não aconselhamos, recomenda-se fazê-lo de maneira discreta: compartilhe apenas o texto do depoimento, evitando revelar identidades completas ou detalhes que possam reconduzir ao cliente, como fotografias ou informações específicas.

A necessidade de mudanças no Código de Ética

É essencial reconhecer que o contexto atual está evoluindo e o Código de Ética precisa ser reescrito, especialmente considerando a ascensão de plataformas digitais como Google Meu Negócio, Reclame Aqui, Facebook, Instagram, entre outras. Nesses espaços, é comum que clientes expressem espontaneamente seu reconhecimento pelo trabalho realizado pelos advogados.

E muitas vezes, os advogados não tem controle sobre dessas manifestações.

A gratidão manifesta-se naturalmente em todos os seres humanos, pois advém da reciprocidade na ajuda recebida. Portanto, é compreensível que esses depoimentos sejam uma consequência natural da satisfação dos clientes. Afinal, o advogado resolve problemas, soluciona questões importantes e traz alívio as pessoas.

Com isso, a divulgação desses depoimentos não deve ser usada contra os advogados, mas sim como uma demonstração genuína da qualidade e impacto de seu trabalho. Isso também serve como um incentivo para os advogados a continuarem a exercer sua profissão com dedicação e paixão.

Agora, sobre outro viés, do marketing propriamente dito, ter depoimentos nas redes sociais pode melhorar a visibilidade dos conteúdos que os advogados publicam, ajudando os algoritmos a promover essas informações.

Isso se alinha com o marketing de conteúdo, que é permitido pelo Código de Ética!

Afinal, o propósito de estar no Google Meu Negócio é usar a publicidade através do marketing de conteúdo, que é permitido pelo Código de Ética, que em seu artigo 39:

"A publicidade profissional do advogado tem caráter meramente informativo e deve primar pela discrição e sobriedade, não podendo configurar captação de clientela ou mercantilização da profissão. "

Por exemplo, no Google Meu Negócio, os comentários podem significativamente aumentar a visibilidade orgânica de um perfil. Isso ocorre porque um maior número de comentários pode melhorar a entrega do perfil nas buscas do Google, expandindo assim o alcance do advogado. Essa é uma técnica eficaz de SEO (Otimização para Motores de Busca).

Interpretando a Proibição de "Divulgar" e "Deixar Divulgar"

Vamos revisitar o artigo 42, inciso IV do Código de Ética (antigo art. 33 do Código Revogado):

"Divulgar ou deixar que seja divulgada a lista de clientes e demandas."

Ao discutir o artigo, é crucial compreender a distinção entre "divulgar" e "deixar que seja divulgada".

  • "Divulgar" implica uma ação direta do advogado para promover uma lista de clientes, o que pode ser interpretado como uma forma de captação de clientes, algo que é proibido.
  • Já "deixar que seja divulgada" pode ocorrer de forma mais espontânea, como no caso de depoimentos deixados no Google Meu Negócio, o que não teria qualquer implicação ética.

Ademais, considerando o conceito literal de uma "lista de clientes", que envolveria um registro com informações detalhadas dos clientes, ao evitar divulgar dados específicos em depoimentos, o advogado não estaria expondo uma lista de clientes propriamente dita.

Concluo dizendo que o uso de depoimentos de clientes em estratégias de marketing deve ser tratado com cautela e seja qual for sua escolha, sempre leve em consideração a finalidade da lei e os princípios éticos que devem guiar a advocacia.


Espero ter te ajudado!

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